Cerca de duas mil pessoas lotaram o Ginásio Municipal de Juína, na noite de ontem (01.04), para debater a ampliação da Terra Indígena Enawenê-nawê. Durante mais de duas horas, lideranças políticas, comerciantes e a sociedade civil organizada manifestarem-se contrários ao projeto da Fundação Nacional do Índio (FUNAI) de expandir em 600 mil hectares os limites da reserva, avançando também sobre as cidades de Brasnorte e Sapezal.
O debate promovido pela Assembleia Legislativa deu início a um movimento pela aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215- em tramitação desde o ano 2000- que transfere ao Congresso Nacional a competência exclusiva pela demarcação de terras tradicionalmente ocupadas pelo índios e a ratificação das demarcações já homologadas. O próximo passo, segundo autor da audiência pública, deputado Dilmar Dal’Bosco (DEM), será a realização de uma marcha à Brasília, com a presença da população dos três municípios envolvidos no processo, já no mês de maio.
“Não existe consulta pública quanto a ampliação dessas áreas, que é feita de forma impositiva pela Funai, sob orientação de ONGs e antropólogos, que, na maioria das vezes, estão servindo à interesses internacionais. Existem muitos minérios e madeiras preciosas nessas localidades, que estão inseridas na Amazônia Legal”, criticou Dilmar.
Dal’Bosco revoltou-se com a ausência dos representantes da Funai, que em ofício encaminhado na data da audiência, informou que não mandaria representantes à Juína, dada a complexidade do assunto. “A Funai se acovardou de estar presente na audiência pública. Mas uma prova de que só conseguiremos barrar este processo através de pressão junto ao Congresso Nacional. O Executivo Federal não avalia as consequências econômicas e sociais decorrentes dessas desintrusões”, ponderou Dilmar.
A insatisfação com o órgão também foi demonstrada pelo deputado federal Nilson Leitão, que classificou a proposta de ampliação das terras indígenas como irresponsável e desumana. O tucano é autor de um requerimento para criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) destinada a investigar a atuação da Funai e do Incra na demarcação de terras indígenas e de remanescentes de quilombos.
“A Assembleia Legislativa não tem legitimidade para resolver a questão indígena, mas tem legitimidade para mobilizar a classe produtora e pressionar o Governo Federal. Mas rápido que a PEC é uma canetada da presidente, um decreto presidencial regulamentando a criação de áreas indígenas”, disse Leitão, que está coletando assinaturas para implantação da CPI.
Com o discurso alinhado, os prefeitos de Juína, Hermes Bergamin (PMDB) e de Brasnorte, Pedro Coelho (PT),demonstraram preocupação com a insegurança jurídica causada por esse projeto, que inviabilizaria a economia dessas cidades que já têm mais da metade de suas áreas tomadas por reservas. Outra argumentação apresentada pelos gestores é de que os indígenas não reivindicam a ampliação da reserva, a proposta teria partido da Funai que, segundo Bergamin, estaria incitando os nativos contra a sociedade.
“Moro aqui há mais de 30 anos e nunca tivemos problemas com os indígenas. A Funai deveria cuidar da saúde e da educação dessa gente, que ainda hoje morre de doenças como desnutrição e tuberculose”, cobrou o prefeito de Juína. “Essa luta não é uma questão indígena. Índios reivindicam mais saúde, educação e cultura, pois eles sobrevivem apenas da venda de castanhas, em condições deploráveis”, completou o gestor de Brasnorte.
Os deputados Wagner Ramos (PR) e Luciane Bezerra (PSB) também participaram da audiência pública, ao lado do presidente da Famato Rui Prado que organizará, junto a Assembleia Legislativa e aos municípios afetados pela ampliação, à marcha a Brasília.